domingo, 14 de setembro de 2014

Por que não chutar cavaletes de propaganda eleitoral: a esquerda militante e o seu povo revoltado

Abigail Pereira Aranha

Circula no Facebook uma campanha "já chutou seu cavalete hoje?"[1] como manifestação de revolta contra a política (não contra os políticos, vou voltar neste ponto). Fora isso, alguns divulgam fotos de propagandas de candidatos depredadas. E no mundo real, vamos ver alguns cartazes de candidatos colados em muros ou em cavaletes derrubados, furados ou rabiscados. Vamos chegar a algum lugar com isso? Vamos: a pior do que já está.

Você que é de direita já percebeu que você basicamente só encontra os companheiros no Facebook, e no seu cotidiano fora da internet quem não é lulopetista[2] quase sempre é anti-política? Isso significa que a esquerda está dominando o país. Não é estar quase sem oposição na Presidência da República, não me refiro à política formal, me refiro ao Brasil como um todo. Pouquíssimos jornalistas de direita nos jornais e nas revistas impressos, e sempre hostilizados por colegas; os colunistas abertamente cristãos sempre em colunas de opinião, geralmente clérigos ou beatos desinteressantes; mas Guilherme Boulos, o playboy dono do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) é colunista da Folha de São Paulo. Um grupo chamado As Putinhas Aborteiras se apresenta na TV Educativa do Rio Grande do Sul, mas a cantora Elba Ramalho foi ameaçada por feministas por ser contra o aborto. Você pode ouvir piadas feministas de qualquer atendente que no mesmo dia viu revoltada uma foto de alguém torturando um animal. E por aí vai.

E por que as pessoas que se dizem insatisfeitas com os políticos estão dominadas pela esquerda? Primeira coisa: é uma tremenda estupidez criticar a classe política numa democracia. Se existem eleições diretas, os políticos foram eleitos por maioria pelo povo (fora o tal quociente partidário que dá a vaga a candidatos que não estavam entre os mais votados). Ah, mas as eleições são manipuladas, os políticos são eleitos pelo poder econômico,... É sobre isso que eu estou tratando aqui: frases feitas. Os candidatos vieram do povo, não são de um clã pior que os outros (lembrando que branco rico também pode ser povo). E nem os cidadãos honestos estão proibidos ou impedidos legalmente de se candidatarem a cargos políticos. Então, qual a dificuldade para sair algo que preste da política?

Ainda um pouco sobre as frases feitas. Políticos eleitos pelo poder econômico? O voto é censitário desde quando? Ou é o povo que elege o candidato por causa de propaganda na Rede Globo, pesquisa comprada, voto comprado? Em tempos de internet popular, quantos já visitaram as páginas dos candidatos ou dos partidos, algumas delas blogues gratuitos simples do Blogger ou do Wordpress?

Desde as vadiagens da extrema-esquerda de junho do ano passado que os desinformantes chamam de manifestações populares ou de Primavera Brasileira, nós estamos ouvindo o povo de verdade nas ruas de verdade com um discurso contra a política que antes era coisa de grupos de esquerda sem expressividade. Atenção para as palavras que eu usei nessa frase.

Primeiro: discurso contra a política, não contra os políticos. Os políticos passam, até uma múmia como o senhor José Sarney, que disse que a política só tem porta de entrada e ninguém mostrou ainda a saída pra ele. Quem NÃO É contra a política NÃO diz que TODOS os políticos são corruptos, incompetentes e descompromissados. Se é possível fazer algo bom na política, a solução é colocar as pessoas certas nos cargos políticos certos. E a democracia é o meio para o povo ajudar a fazer exatamente isso. E para a vida política nacional ser boa, pode até ser necessária uma reforma política. Mas uma reforma política é uma reforma de fundamentos, então é preciso mostrar que algo que está dando errado não pode dar certo sem alguma mudança no sistema, e também deve se mostrar qual é essa mudança que deve ser feita e por que essa mudança vai resolver o problema. Agora vai perguntar pra um defensor da "reforma política" qual é o número da lei do Código Eleitoral.

Segundo: grupos de esquerda sem expressividade. Ou, como diz o parceiro Luciano Ayan, "coletivo não-eleito". Mas se uma assembleia de movimento estudantil não junta 20% dos próprios estudantes da universidade, como é que gente que nem de lá é pode falar parecido com a militância? É, eu já ouvi gente que nunca estudou numa universidade falando em "mídia manipulada", "políticos eleitos pelo poder econômico", "sociedade patriarcal". Mas por que isso acontece? Porque movimento socialista é igual feminismo: não existem vários feminismos, existe um movimento com duas caras. E também porque os marxistas há muito tempo se instalaram nas universidades, e de lá saem os jornalistas e os professores das próprias universidades e da educação básica. Não é que cada pessoa formada em uma universidade se forme marxista, mas se os marxistas nos corpos docentes e outros marxistas com influência nas universidades tiverem um projeto de socialismo, e eles têm, eles podem formar alguns militantes e com o tempo aprofundar o trabalho na sociedade como um todo.

Falando em projeto socialista, a própria universidade brasileira chegou num nível crônico de imbecilização há pelo menos uns 20 anos. Qualquer popular bem alfabetizado razoavelmente informado e com raciocínio lógico íntegro pode humilhar qualquer professor universitário com exceção dos que realmente merecem o cargo e o diploma e dos psicopatas. O governo Dilma Rousseff foi tosco, mas a oposição política já tinha sido quase neutralizada pelo Mensalão[3], sendo a própria presidente uma ex-guerrilheira pró-socialismo que de vez em quando usa o próprio passado, o real mais o fantasiado, como ponto forte. Aliás, o deputado federal Jair Bolsonaro, que é um dos grandes nomes da oposição, é demonizado exatamente pelo contrário: por ter sido militar e anticomunista. Então, aquelas manifestações de junho de 2013 canalizaram o que sobrava de indignação popular de uma forma segura para o governo e principalmente para o socialismo brasileiro. A revolta foi contra problemas de verdade, mas não teve um bode expiatório por falta de candidatos.

Mas parte da revolta contra a política, não contra os políticos, também é fuga da autocrítica. A operação pela rede pública de saúde marcada para meses depois, a escola mal conservada, a falta de pessoal e viaturas na delegacia de polícia, o mau estado das ruas do bairro ou da rodovia de acesso à cidade, tudo isso tem a ver com os eleitores que não sabem que o candidato existe se não estiver pelo menos em terceiro lugar nas pesquisas manipuladas. O dinheiro talvez falte, os funcionários públicos talvez estejam sobrando onde não se presta serviço à população, mas com certeza políticos sem competência técnica e sem qualidade moral para a política são culpados, e eles foram eleitos por maus eleitores.

A direita brasileira está mais em blogues de raros jornalistas sobreviventes na grande mídia e grupos de anônimos do Facebook e da blogosfera do que no Congresso. O anarquismo parece ainda mais confundido com o pior da militância de extrema-esquerda, inclusive porque essa militância se aproveita do nome. Portanto, o cidadão comum literalmente não sabe mais viver sem o socialismo-feminismo. As livrarias brasileiras mal tiveram livros de direitistas por persistência destes depois de muito sucesso na internet, o resto foi romances para ninfetinhas fúteis, livros religiosos de qualidade questionável, amenidades de celebridades, outros lixos e uma ou outra obra que se salva. O cidadão comum talvez fique preso no trânsito por causa de um protesto de professores reclamando do salário, mas não sabe que o desempenho do Brasil no PISA é vergonha mundial e foi nesta década que uma universidade brasileira (a USP) entrou nas 200 melhores do mundo. Este cidadão comum talvez veja uma notícia de um evento feminista tipo Marcha das Vadias contado como se fosse uma festa de rua qualquer, mas não lê que os homens são maioria dos mortos por acidente de trabalho, violência urbana ou suicídio. O cidadão comum ou a cidadã comum acharia um escândalo descobrir que a professora do filho dele(a) tem uma foto ousada circulando em rede social ou fez um filme pornô, mas não se incomoda se o filho ainda for analfabeto funcional com lavagem cerebral esquerdista quando terminar o Ensino Médio. O cidadão comum homem pensa que está em fuga alucinada de uma pornografia tão presente quanto propaganda de carro e de mulheres sexualmente liberais em cada quilômetro quadrado da cidade, isso no mesmo dia em que vê um cartaz de campanha contra assédio sexual ou pedofilia com um telefone exclusivo para denúncias em algum pequeno comércio. Este homem cidadão comum tem o perfil de rede social bisbilhotado por lésbicas criadoras de intriga e o celular bisbilhotado pela namorada desagradável. Então, chutar cavaletes com a propaganda de qualquer político na rua virou uma terapia, e boa parte do que restou de liberdade.

Notas:

[1] "Você já chutou seu cavalete hj ?": http://pt-br.facebook.com/VoceJaChutouSeuCavaleteHj. A página é de 2012 (eleições para prefeitos e vereadores). Já na época, foi assunto de matéria do Último Segundo ("Campanha nas redes sociais incentiva chute em cavaletes de candidatos", 01/09/2012). Matheus Pichonelli fez um artigo muito bom sobre isso na Carta (O) Capital: "Palhaço, eu?", 07/09/2012. (clique aqui para voltar ao texto)

[2] lulopetista: defensor entusiasmado do PT (Partido dos Trabalhadores) e do ex-presidente da República do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva (clique aqui para voltar ao texto)

[3] Mensalão: esquema de compra de votos de congressistas de partidos nominalmente de oposição para votar de acordo com os interesses do então presidente Lula, denunciado na grande imprensa em 2005 (clique aqui para voltar ao texto)

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