O Carlos Andreazza publicou no Facebook em 18 de setembro de 2017[1]:
Editei um livro de Olavo de Carvalho - um dos maiores best-sellers da história do mercado editorial brasileiro - e a imprensa o ignorou, mesmo que, por meses, aparecesse entre os mais vendidos na página ao lado.
Nada disso era notícia. Mas - vejam que coisa - notícia sobre Olavo de súbito é a carta de uma filha o atacando[2].
Se o Carlos deduziu daí uma perseguição da imprensa ao Olavo, alguma campanha de assassinato de reputação contra o Olavo, ele trouxe dados certos e errou na conclusão. Antes de explicar, vou trazer um trecho de uma reportagem da revista Época[3]:
Em 1996, convidado a coordenar a editora da Faculdade da Cidade, no Rio de Janeiro, Olavo recebeu do chefe a tarefa de, dali a duas semanas, colocar a recém-nascida editora na Bienal do Livro. "Mas como? Não temos nenhum livro publicado!" Olavo correu. Numa máquina que a Xerox acabara de inventar, imprimiu cópias de um livro do ex-ministro Mangabeira Unger com o já – e ainda – presidenciável Ciro Gomes. E de outros três títulos. Juntou as anotações em que insultava a elite dos pensadores brasileiros e aproveitou para incluir na empreitada um título seu, O imbecil coletivo. Foi ali. No meio da década de 1990, o autodidata, astrólogo, jornalista, que estudara desenho artístico e cinema, se tornaria "o filósofo conservador Olavo de Carvalho", como é conhecido até hoje.
Como o próprio Olavo já disse, o antiolavismo é um sinal da decadência cultural do Brasil. A autora dessa reportagem, Flávia Tavares, pelo menos cita o título de um livro que o Olavo escreveu e, em outro trecho, que ele já trabalhou na mesma revista Época. Os antiolavistas nem isso fazem. Ela cita o livro "O imbecil coletivo", que foi uma seleção de exemplos de incompetência intelectual no ambiente acadêmico, na imprensa e no mercado cultural daquela época, década de 1990. E era gente ilustre, que ele demolia em artigos de jornal ou debates em universidades, mas tinham livros ou artigos publicados. Hoje, os críticos de Olavo de Carvalho se reúnem no Facebook ou nos comentários de vídeos do Youtube para falar da astrologia que ele praticava na década de 70 e do esoterismo na década de 80. Mas os críticos do Olavo de Carvalho são uma minoria insignificante, porque quase todos os brasileiros nunca ouviram falar dele. Mas eles nunca ouviram falar dele porque são analfabetos funcionais, nunca leram um livro inteiro na vida, não discutem política ou já bloquearam o primo no Facebook porque leram dois comentários que não concordam. Carlos, você esperava que um Brasil onde poucos graduados leram três livros técnicos inteiros da própria área tivesse uma revista onde fizeram uma reunião na redação e alguém disse "temos que fazer uma reportagem contra o Olavo de Carvalho sem falar dos quase 20 livros que ele escreveu"? O desprezo fingido e o desinteresse sincero por pessoas de alto nível intelectual e moral não são mutuamente exclusivos.
Mas o interesse sincero da mídia tradicional por Olavo de Carvalho existiu nessa e em outras matérias. Antes de explicar por que, vou trazer um trecho de uma postagem do The Huffington Post Brasil sobre Umberto Eco[4]:
"As mídias sociais deram o direito à fala a legiões de imbecis que, anteriormente, falavam só no bar, depois de uma taça de vinho, sem causar dano à coletividade. Diziam imediatamente a eles para calar a boca, enquanto agora eles têm o mesmo direito à fala que um ganhador do Prêmio Nobel. O drama da internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade".
Depois de uma cerimônia em que recebeu o título de doutor honoris causa em comunicação e cultura na Universidade de Turim, em 2015.
"A internet não seleciona a informação. Há de tudo por lá. A Wikipédia presta um desserviço ao internauta. Outro dia publicaram fofocas a meu respeito, e tive de intervir e corrigir os erros e absurdos. A internet ainda é um mundo selvagem e perigoso. Tudo surge lá sem hierarquia. A imensa quantidade de coisas que circula é pior que a falta de informação. O excesso de informação provoca a amnésia. Informação demais faz mal. Quando não lembramos o que aprendemos, ficamos parecidos com animais. Conhecer é cortar, é selecionar".
Em entrevista à Revista Época, em 2011.
Umberto Eco deve ser lido e ouvido como um cara que devia o que foi aos meios tradicionais de comunicação de massa, incluído aqui o mercado livreiro. Todos os que já falaram em "idiotas da internet" se incomodavam não com os idiotas, mas com as pessoas inteligentes que ganharam meio de expressão sem pedir a misericórdia dos grandes veículos. Com a horizontalidade da internet atual, ela pode ser também meio de informação. Por sinal, o Umberto Eco se trai quando diz que a internet traz "informação demais". Vou explicar melhor com alguns trechos do meu texto "A internet e os porteiros dos céus", de junho de 2015[5]:
Dos livros às redes sociais
(...) Quase todos os colunistas e jornalistas e quase todos os professores e pesquisadores universitários são como porteiros do conhecimento do mundo real: ficam na entrada para controlar quem entra e o que sai. Pra começar, eu, sendo ateia, me lembrei de um texto bíblico e vou fazer uma analogia: "Mas ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois que fechais aos homens o reino dos céus; e nem vós entrais nem deixais entrar aos que estão entrando." (Mt 23:13)
(...) O slogan "leia livros" já foi válido, hoje é um clichê obsoleto de burgueses fanfarrões pseudointelectuais que, para começar, confundem o formato de uma obra cultural com o conteúdo em si, e talvez devam ser informados de que blogues não são (sempre) coisa de jovem sem o que dizer e o que fazer (a Presidência da República tem um blogue). Pelo menos no Brasil de hoje, livros impressos só são indicáveis, com cada vez mais cautela, para informação técnico-científica. Lendo livros, nós podemos ganhar conhecimentos valiosos, mas vamos achar menos uma história do conhecimento do que uma história da sobrevivência da estupidez.
(...) Nossas redações de jornais e revistas estão repletas de vadias, lésbicas velhas e afeminados viajando pelo país e ao exterior para aproveitar hotéis cinco estrelas e passeios turísticos e voltar com um texto que sabem que o diretor de jornalismo vai aceitar. Nossas universidades também amam alunos e professores em eventos pomposos para apresentar trabalhos inúteis que pouquíssimas pessoas vão saber que existem. Todas essas pessoas, ou quase todas, vão à fonte do conhecimento ou da notícia para garantir que eles não saiam de lá. Isso, como eu tentei mostrar, não é coisa nova, mas piorou de poucas décadas para cá.
(...) O azar deles é que a internet livre da forma como conhecemos (que, aliás, começou como uma ideia militar genial) surgiu e se popularizou nos países desenvolvidos e alguns em desenvolvimento antes de um governo socialista formal.
A mediocridade geral faz a internet também medíocre em geral, mas gente de boa cabeça também entra com bom (ou ótimo) conteúdo. Em um país de idiocracia, são os bons que perdem ou nunca podem ter espaço na grande mídia. Até a década de 90, apareciam em jornais e revistas, com boa vontade, em uma seção de cartas de leitores ou em um artigo de seção de opinião. A internet, em especial a blogosfera, a vlogosfera e as redes sociais, é um grande canal para quem tem a compartilhar algo bom (ou mau, mas importante) e deixar isso acessível, em tese, a qualquer pessoa que possa entender o idioma.
Eu mesma tenho alguns blogues e estou em redes sociais, publico algumas ideias na forma de textos que sem a internet só seriam conhecidas por poucos parentes e amigos. Eu comecei a partir de algumas observações do cotidiano, eu tinha 15 anos, mas eu já sabia que se eu seguisse o conselho de ler mais antes de escrever o que eu já observava, eu estaria reconhecendo o direito de quem sabia mais, sabia que eu dizia a verdade e poderia estar dizendo de me calar, não a autoridade da mesma pessoa para dizer alguma coisa.
(...) Aí, os "convencionais" se deram mal. E parecem que ainda não se deram conta de que não estão mais na década de 90. Os grandes veículos de comunicação ainda insistem em produzir celebridades que sem eles teriam sua existência ignorada merecidamente. Mesmo eu sendo uma mocinha normal sem muito currículo, digo sem medo que a grande diferença entre eu e grande parte dos jornalistas do Brasil e de outros países é que eles estão no jornal X ou no canal Y e eu não, e SÓ POR ISSO eu sou relativamente desconhecida e eles não.
(...) Quem antes só assistia televisão para ver o jornal hoje lê notícias, talvez os mesmos textos, na internet. Em algumas matérias de grandes jornais na internet, a área de comentários é mais jornalística do que o texto comentado. Pesquisas que até 20 anos atrás seriam longas e exigiriam deslocamento físico pelo menos para a biblioteca pública municipal em horário comercial podem ser feitas (ou encontradas) pela internet, talvez nas lacunas do expediente de trabalho (aliás, eu consultei a Wikipedia para escrever esse texto, hehehehe). Bons livros silenciados, desconhecidos ou mal mencionados até em publicações especializadas em cultura podem ser encontrados na íntegra em versão digital. Pessoas de uma competência excepcional e até grupos inteiros que tiveram espaço negado nos grandes veículos por pressão esquerdista, como Ativistas de Direitos Humanos dos Homens e Meninos ou a direita no Brasil, conseguiram se juntar na internet, publicar suas ideias, compartilhar informações e se definir pelos próprios escritos até ganhar espaços esporádicos nos veículos tradicionais, a contragosto, não raro para tentar desqualificá-los. Já houve um tempo em que mesmo quando "especialistas" e jornalistas admitiam a contragosto algo que tentaram esconder, em alguns casos por décadas, porque chegou ao conhecimento público, eles ainda podiam fazer isso não como quem reconhece a verdade, mas como quem decreta os fatos. Hoje, tanto banalidades quanto notícias de verdade são publicadas no jornal porque são conhecidas do público, e não vice-versa. Se não fosse a internet razoavelmente livre de alguns países, o mundo todo seria ainda mais esquerdista, anorgásmico, mal informado e ridículo. Ainda há muito a ser feito, mas quem estava na portaria dos céus já não determina como antes quem entra e o que sai.
Ah, eu não consegui achar e vou contar de memória: uma das vezes que eu vi o termo "idiotas da internet" foi quando o deputado que saiu do anonimato com o Big Brother Brasil e o ativismo LGBT, Jean Wyllys, atacou o Olavo de Carvalho no Facebook. Entenderam agora por que eu me lembrei do Umberto Eco?
Mas as matérias jornalísticas sobre o caso Heloísa de Carvalho versus Olavo acabaram confirmando aquele texto que eu escrevi mais de dois anos antes. Aquela matéria da Época acaba deixando escapar (vou grifar)[6]:
Após um longo período sem se ouvir falar de Olavo de Carvalho, especialmente depois que ele se mudou para os Estados Unidos, em 2005, seu nome voltou a aparecer em conversas nas rodas da direita. Olavo se radicalizou e esposou ideias divorciadas dos fatos. Passou a divulgá-las compulsivamente nas redes sociais – Olavo tem 380 mil seguidores no Facebook e 190 mil no Twitter. Personalidades como o apresentador Danilo Gentili (16 milhões de seguidores no Twitter) se declaram seu fã. O filósofo foi cedendo cada vez mais espaço ao conservador.
Bom, que o Olavo de Carvalho conservador, católico, às vezes tira o brilho do filósofo, até eu já disse algumas vezes, uma delas na página do próprio Olavo. Mas você viu aqui, Carlos? A imprensa brasileira ignorou "um dos maiores best-sellers da história do mercado editorial brasileiro", ignorou o Curso Online de Filosofia, mas... prestou atenção em quantos seguidores o Olavo tem no Facebook e no Twitter, e também nos inscritos no Youtube (38 mil, número mostrado no vídeo).
Antes de concluir, vou mostrar pra vocês uma imagem da imprensa do mundo desenvolvido ou em desenvolvimento. A Jessica Valenti é uma colunista do The Guardian. Este flagrante foi compartilhado por um amigo meu do Facebook[7]:
Jessica Valenti
Eu olho no futuro para todas essas #MulheresContraOFeminismo devolvendo seus votos, cartões de crédito, deixar a família, representação política, leis antiestupro e controle de natalidade. Há um cesto na porta, sintam-se à vontade para deixá-los lá!
Mercedes Carrera
@JasAfk, eu olho no futuro para todas essas mulheres que querem #MatarTodosOsHomens deixando seus iPhones, carros, cosméticos e apartamentos que OS HOMENS CONSTRUÍRAM para trás!
Essa é uma imagem da imprensa tradicional: uma lésbica colunista de um jornal do Reino Unido diz uma bobagem, ouve o que não quer de outra mulher dos Estados Unidos, um rapaz da Índia dá um print screen da cena e publica no Facebook marcando uma garota do Brasil. Quem é o idiota da aldeia, Umberto?
A matéria "Filha publica carta com acusações contra Olavo de Carvalho" nunca esteve entre as 10 postagens mais lidas da revista Veja, mas a matéria "Filha de Geraldo Alckmin revela ter vitiligo" esteve, três dias depois. Isso realmente prova a realidade do antiolavismo, mas não é aquela corrente "do Olavo de Carvalho não se fala", nem mesmo uma onda de baixo nível de ofensas e difamações. O antiolavismo ficou mostrado aqui como um sinal de decadência não só cultural, também, e principalmente, mental. Onde uma publicação impressa se dá o trabalho de atacar alguém que só usa as redes sociais, essa mesma publicação não percebe que não vai parar de vender cada vez menos por isso, um jornal com página na internet não se dá conta de que artigos progressistas são demolidos na própria seção de comentários, e o desprezo fingido e o desinteresse sincero pelo que mostra superioridade moral e mental não são mutuamente exclusivos nem no nível individual.
NOTAS:
[1] https://www.facebook.com/carlos.andreazza.5/posts/1457003501065519
[2] Uma das matérias: "Filha publica carta com acusações contra Olavo de Carvalho", Veja, 18 de setembro de 2017, http://veja.abril.com.br/brasil/filha-publica-carta-com-acusacoes-contra-olavo-de-carvalho.
[3] "Olavo de Carvalho, o guru da direita que rejeita o que dizem seus fãs", Época, 13 de outubro de 2017, https://epoca.globo.com/sociedade/noticia/2017/10/olavo-de-carvalho-o-guru-da-direita-que-rejeita-o-que-dizem-seus-fas.html.
[4] "'As redes sociais deram voz aos imbecis': Veja as 17 frases mais marcantes de Umberto Eco, morto aos 84 anos", HuffPost Brasil, 20 de fevereiro de 2016, https://www.huffpostbrasil.com/2016/02/20/as-redes-sociais-deram-voz-aos-imbecis-veja-as-17-frases-mais_a_21683863.
[5] "A internet e os porteiros dos céus", 22 de junho de 2015, A Vez das Mulheres de Verdade, https://avezdasmulheres.blogspot.com/2015/06/a-internet-e-os-porteiros-dos-ceus.html; e A Vez dos Homens que Prestam, https://avezdoshomens.blogspot.com/2015/06/a-internet-e-os-porteiros-dos-ceus.html.
[6] Idem nota 3.
[7] "Mulheres Contra o Feminismo... e homens a favor", 05 de julho de 2015, A Vez das Mulheres de Verdade, http://avezdasmulheres.blogspot.com/2015/07/mulheres-contra-o-feminismo-e-homens.html; e A Vez dos Homens que Prestam, https://avezdoshomens.blogspot.com/2015/07/mulheres-contra-o-feminismo-e-homens.html.
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