quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Todos amam a pediatra Júlia Benvindo Paula

- Doutora Júlia!

- Boa tarde, seu Jorge! Como vai o senhor e a sua família?

A moça é uma loura (natural) simpática de 28 anos, corpo violão, seios e bunda médios arredondados, mas com um vestido verde não muito chamativo, em um supermercado. Era um fim de tarde de quinta-feira. Eles conversam na fila do caixa, o senhor é de quase 40 anos, logo atrás. Ela atendeu o filho dele, um belo menino de 8 anos com anemia, no posto de saúde. Até chegar a vez dela, foram 8 minutos. Eles puderam conversar rapidamente sobre algumas manchetes da última semana. Falando sobre uma passeata no centro da cidade principal da microrregião, a doutora diz algumas coisas surpreendentes sobre o financiamento do grupo que organizou a manifestação. Eles também falaram sobre um caso de agressão em uma escola, e a doutora comenta sobre como os estudantes da escola pública são quase analfabetos e os professores são medíocres, e se oferece para dar aulas particulares para o filho de Jorge. Quando Jorge passa pelo caixa e eles se despedem, ele brinca:

- E o próximo filme, quando sai?

- Vai demorar, mas foto de topless no meu Facebook sai depois de amanhã. Fique esperto porque essas fotos não duram muito lá.

A cidade de Campo Bom do Rio Limpo não é muito grande, o povo já sabe que Júlia já fez um filme pornográfico e já tirou fotos para uma página pornô. O perfil dela no Facebook também tem umas fotos provocantes, e no dia ela estava em um bloqueio de 7 dias por causa de uma, de biquíni, denunciada pela irmã de um amigo. Já foram feitos um pequeno protesto e um abaixo-assinado para que ela fosse exonerada do posto de saúde, mas tanto a chefia direta quanto o público (principalmente os homens) reconheciam que ela boa médica, atenciosa no atendimento ao público e uma pessoa muito agradável (simpática, alegre, usava umas camisetas legais,...).

A esposa de Jorge estava por perto, do lado de fora do supermercado. Ela é morena de olhos azuis e tem um corpo razoável, mas é voluntariosa e grosseira. Conversar com a doutora Júlia e ver a cara de desagrado da esposa quando a doutora falou das fotos lhe salvou o dia.

No dia seguinte, a doutora Júlia chega ao posto de saúde com uma camiseta amarela de estampa florida e uma saia comprida rosa, mas olhando com mais atenção através da camiseta ainda se pode ver o soutien verde claro. São 08:32. As primeiras consultas são às 09:00. Da entrada, ela saúda:

- Bom dia, baixinhos!

- Êêêêêêêê!

As crianças só não ficaram mais animadas porque a maioria estava com as mães, que odeiam a doutora. As crianças mais animadas, mesmo indispostas, estão com os pais.

- Bom dia, altinhos!

Alguns "bom dia" animados, vozes femininas quase imperceptíveis. Quase inaudível, um "bom dia, Xuxa" dito com ironia por uma clínica geral.

Um dos primeiros pacientes era um rapaz de 7 anos que estava com verminose, em consulta de retorno. Ele estava com o pai.

- Como está o garotão?

A doutora se abaixou para dar um beijo no garoto. O pai vê, sem querer, um pouco dos seios da moça por dentro da gola da camiseta.

- Ele está bom agora. Brincando, correndo.

Ela volta a ficar de pé.

- Fico muito satisfeita. Mesmo assim, vou dar uma olhada nele e fazer um atestado para ele levar pra escola.

- Obrigado, doutora. Te desejo sucesso e felicidades.

O homem é alto, ela de altura média. Ele, estando sentado, fica com os olhos na altura dos melões da médica. E ele já tinha visto o filme pornô da doutora. Ela viu para onde ele estava olhando. E nem deu bola. E ela viu que algumas mães viram e fecharam a cara. Ela brinca:

- É legal que o ambiente aqui é de respeito. Vocês olham pros meus peitos, pensam em meter a boca nos meus peitos, pensam um monte de outras coisas mas a gente se dá muito bem.

Alguns homens riem. As mães acham um castigo de Deus ter de passar por isso. A doutora dá atenção a mais algumas crianças, com a maioria com as mães contrariadas, e vai para o seu consultório. Às 08:54, atende a primeira criança.

Júlia terminou o expediente e se despede dos colegas e dos que estão na sala de espera:

- Boa tarde, meus fofinhos, estou indo agora para o meu segundo emprego.

Ela também é garçonete em uma lanchonete grande em Rio Limpo, a cidade principal da microrregião. Alguns meses antes, corria entre os desafetos, sem que os eles mesmos dessem muito crédito, que ela era prostituta. Isso também porque ela mora sozinha e tem um padrão de vida modesto, então ela conseguiu até fazer uma pequena poupança para emergências. E ela também já recebeu centenas de homens em casa (entregadores, familiares, amigos, mas ela liberou a periquita só para alguns). Mas esse boato ainda está vivo, só que nas brincadeiras dos amigos. Nessa hora, dois colegas dizem:

- Se você atender o meu cunhado, pode colocar os 50 reais que ele está me devendo na conta, depois manda um abraço meu pra ele.

- Vou te mandar o meu primo, mas vá com calma porque ele é virgem.

No caminho, ela encontra um cobrador da linha de ônibus que ela usa (ele estava de folga):

- Grande Júlia Benvindo Paula! Eu vi o seu pai correndo hoje. Que força!

- Pois é, ele tem 65 anos e a saúde dele é melhor até do que a minha.

- Ah, falando em saúde, você está melhor de ontem?

- Ah, sim, foi um sanduíche que eu comi. E engraçado que eu desci do ônibus, foi a conta de chegar no banheiro da rodoviária de lá pra vomitar e cinco minutos depois passou o mal estar. Obrigada a você e ao Cláudio motorista pela água de coco.

- Foi um prazer. E as lagartixas evangélicas que ficaram chiando, até reclamaram na garagem? E a reclamação foi chegar justo no Quaresma, que também te adora. E por acaso eu tinha falado do caso com ele ontem mesmo. Aí, quem foi reclamar que a gente parou no meio da viagem pra comprar água de coco pra você, viu que não ia conseguir nada e falou que você é piranha, que a gente faz graça...

- Descobriram que vocês estão me comendo também?

Risos. Este cobrador e este motorista são casados e nunca aceitaram a simpatia da moça.

- Falaram isso também.

- O meu convite pra vocês irem lá em casa me visitar no fim de semana continua de pé. E o seu, está de pé também?

Risos.

- Claro. Eu vou com dois amigos te procurar lá no seu trabalho, você vai dar tudo que é possível, dá um desconto pra nós. Vou ter que descer, até semana que vem.

- Até.

15 minutos depois, Júlia entra no ônibus. Deu beijo no rosto no motorista e no cobrador, que ela já conhecia, na entrada. As mulheres passageiras disseram ou pensaram "oferecida". Os homens passageiros pensaram "que simpatia, e gostosa pra...".

Júlia chega à lanchonete. Dá um "boa tarde" animado para os colegas e os clientes na fila. Um dos clientes, que está lá com frequência naquele horário, responde:

- Boa tarde para a garçonete mais simpática da cidade.

As mulheres colegas dela ficam desconfortáveis. Todas elas, mesmo as bonitas, têm sempre modos pouco agradáveis.

- E boa tarde para todos os meus fãs, daqui e do cinema.

As colegas mulheres ficaram de cara ainda mais feia pelo resto do expediente.

Um cliente novo, Armando Pinto, achava que aquela não podia ser a Júlia Benvindo Paula do filme pornô. Confirmou então não só que era mesmo ela como ela não tinha vergonha disso. Fez o pedido, disse que poucas vezes foi tão bem atendido por uma mulher até em grandes redes. Ela deu o perfil dela no Facebook em um pequeno papel impresso que ela mesma tinha preparado. Ele visitou o perfil dela, ela visitou o dele, eles viram muitas afinidades de pensamento um com o outro (política, ética, religião, homem, mulher). Também descobriram gostos parecidos em arte, esportes, literatura, culinária. Eles ficaram amigos e admiradores um do outro dentro e fora da internet. Ele tinha amizade com o gerente de um restaurante, conhecido como Lobo. Alguns dias mais tarde, ele precisava contratar uma garçonete. Armando falou de Júlia e o gerente Lobo se interessou por ela (no sentido profissional). No dia seguinte, Júlia teve um atrito grave com uma colega pouco antes de Armando chegar, um pouco mais tarde que o de costume. Ele fala da vaga nova, e ela se interessa. Armando liga para o amigo Lobo, diz que ela aceitou a oferta e ele chega à lanchonete ao final do expediente. Armando a apresenta, Lobo diz que ele falou muito bem dela, eles conversam cerca de 10 minutos e ela começa no restaurante dois dias depois.

Os novos colegas e o novo patrão eram ótimos, ela passou a ganhar um pouco mais. Nos primeiros dias, ela estava conversando com colegas antes de começar o expediente, eles estavam comentando sobre um vídeo íntimo de uma atriz divulgado na internet e ela soltou uma brincadeira:

- Se vocês ouvirem por aí que tem um vídeo meu com namorado na internet, é mentira. Eu nunca tive namorado, o meu vídeo é profissional com três de uma vez.

Lobo estava presente e sabia do que ela estava falando. Ficou um tanto surpreso com a cara de pau da moça, mas achou graça mesmo sem comentar.

Depois que o restaurante começou a fazer também sanduíches, e que vários clientes da lanchonete viram onde ela estava trabalhando a menos de 500 metros, o antigo trabalho de Júlia perdeu clientes e receita espantosamente quase da noite para o dia, porque a única pessoa que atendia os clientes com educação saiu, mas a empresa se deu conta de que algo ia mal quase quando fechou as portas.

Em um sábado, ela foi levar o pai e um irmão para Rio Limpo, para a casa nova do outro irmão. Eles estavam em um ônibus cheio e uma mulher feia, magra e parecendo mais velha do que era arruma um escândalo.

- Para de me encostar.

O homem, ainda tentando manter a cortesia, responde:

- O ônibus está cheio, dona.

Júlia está perto e brinca:

- Poxa, um rapaz tão simpático vai se esfregar no Ramsés I? Larga ela e vem aqui me encoxar.

Risada geral no ônibus. Segundos depois, ainda entre risos, um coro masculino:

- En-co-xa, en-co-xa, en-co-xa,...

O homem, um negro claro de uns 30 anos com um macacão manchado, mas limpo, se aproxima de Júlia.

- Êêêêêêêêêêêê! - grita o coro masculino.

- Pode vir, eu vi que você é um rapaz simpático, trabalhador, bacana. Pode encostar, pode passar a mão, pode encostar o pau duro na minha bunda, dá pra ver que você é gente boa. Qual o seu nome?

- Onésimo.

- O meu é Júlia. Este aqui do lado é o meu irmão, este aqui sentado é o meu pai.

Eles se cumprimentam de olhares, Onésimo um tanto desajeitado. Júlia prossegue:

- Eu sei o que você está pensando. Tem mulher, criança, o meu pai, o meu irmão presente no ônibus e eu falando em safadeza. O meu irmão e o meu velho já conhecem o que eu faço e o que dizem que eu fiz. As crianças estão aprendendo, pra elas a gente explica. Quem não pode ouvir falar em peru são as mães que reclamam mesmo. Ou as vovós. Se eu mostrar os peitos aqui, as crianças vão é dar risada.

Risadas masculinas no ônibus. Principalmente porque "Ramsés I" estava com seus dois netos sentados à sua frente e murmurou alguma coisa sobre as crianças estarem presenciando aquilo. Ela estava pensando em dizer alguns desaforos para Júlia, mas ficou desmoralizada como nunca na vida. A senhora sabia que desafetos da sua vizinhança estavam lá, rindo daquilo tudo, e que seria a piada do mês no bairro.

- Mas pode se soltar, gatinho. Mas e você viu aquela obra do canal que finalmente saiu e ficou bonita?

Eles conversam sobre as últimas notícias do Brasil e da cidade. Onésimo perguntou a Júlia se ela já leu "A Revolução dos Bichos", de George Orwell, antes de fazer um comentário sobre política. Ela disse que sim. A conversa ficou ainda mais animada. Ele desceu do ônibus pouco antes dela, ela deixou o perfil dela no Facebook, ele visitou, e eles também se tornaram amigos na rede, embora tivessem pouco contato no mundo real.

Mas quando foi aberto um concurso público em Campo Bom do Rio Limpo, ela incentivou Onésimo a concorrer ao cargo de bibliotecário e esclareceu algumas poucas dúvidas sobre Língua Portuguesa e Informática por e-mail e celular até a véspera da prova. Onésimo conseguiu passar na prova. Ele se mudou para a cidade e eles ficaram mais perto (Júlia morava no mesmo endereço em Rio Limpo, mas era longe de onde Onésimo morava). Só depois de duas semanas no novo trabalho ele vê Júlia chegar e um colega, rapaz de 18 anos, se aproxima dela logo antes, os dois conversam rapidamente e ele pergunta:

- E aí, quando você vai voltar a trabalhar com transporte clandestino?

Então, Onésimo pergunta:

- Você já foi perueira?

- Não, fofinho. É que eu fiz o filme "O ônibus clandestino do sexo".

- E ela é a mais gostosa e a mais safada do filme. - diz o rapaz com quem ela estava conversando.

A conversa rápida pouco antes era normal como de amigos, então Onésimo ainda acha que é brincadeira. Júlia continua:

- Ah, é, eu nunca te falei. Mas você ainda acha pela internet. Pode ir no Pornhub e pesquisar "Júlia Benvindo Paula" ou "ônibus clandestino do sexo" que você me acha lá. Você vai gostar. E então, gatinho, está bem, está com dificuldade com alguma coisa, está bem no trabalho?

Júlia e Onésimo conversam por uns 5 minutos. Enquanto isso se passava, duas funcionárias, de quase 50 anos bem apresentáveis e queridas na cidade mas muito moralistas, conversam ao fundo:

- Eu detesto essa menina. Além de piranha, você viu que cara de pau? Mulher que fez filme pornô pelo menos esconde. Essa aí, na mesma hora em que fala de filme pornográfico já está falando de culinária, de criança, de caso que aconteceu com amigo.

- Pois é, eu já falei com o meu marido pra não trazer a nossa netinha pra fazer consulta com ela aqui. Ela tem pediatra em Rio Limpo. Os rapazes da igreja faltam faltam rolar de rir da cara da gente por isso, mas a gente precisa tomar distância. E as mulheres de hoje têm que se dar mais ao respeito.

- Depois a gente fala de valores, de se dar ao respeito, nós somos paradas no tempo, sem orgasmo, mal resolvidas e uma dessas é que é a Queridinha do Brasil.

À noite, no mesmo dia, Onésimo vai pesquisar no Pornhub ainda achando que é brincadeira, já que Júlia é muito brincalhona. Não era. Ela está lá, com três ao mesmo tempo. Ele é mais "uma a um", mas gostou do que viu. Eles já tinham transado uma vez e achou que ela era muito boa, mas nem imaginava que fosse profissional. E passou a gostar um pouco mais da amiga, além dos outros motivos, pela coragem.

Em um domingo, Júlia leva Onésimo, Armando, Lobo e o irmão de Rio Limpo em um almoço de aniversário de um sobrinho. Na casa são o pai, o outro irmão, a esposa dele e o filho único aniversariante. A mãe de Isadora faleceu poucos anos antes, mas ainda ouviu falar do filme da filha. A casa é a mesma onde morava a falecida avó paterna. Lobo ofereceu seu carro para levar Júlia e seus amigos quando ela estava combinando com o irmão e os amigos de irem juntos de ônibus. Onésimo e Armando já estavam transando com Júlia com certa frequência. Chegando, Júlia relembra ao pai e ao irmão onde conheceram Onésimo e apresenta os outros amigos à família e depois brinca:

- Eu juro que os três são só amigos. O Lobo, eu estou tentando dar pra ele mas ele é casado. Eu cheguei do mesmo jeito que os outros dois me deixaram antes da viagem.

No resto, fora algumas brincadeiras como esta, foi como qualquer encontro de família com uma conversa animada e comilanças.

Abigail Pereira Aranha

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