quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Vamos falar na crise sem nome

Abigail Pereira Aranha

Pessoal, nós temos falado e ouvido falar de crise de 2014 pra cá. Certo, nós temos visto desemprego, empresas fechando, empresas vendendo menos, pessoas comprando menos e devendo mais (nós, inclusive). Mas eu queria que vocês observassem uma coisa: quem sabe dizer o que é a tal "a crise"? Tivemos uma crise imobiliária nos Estados Unidos em 2007, 2008. Nós sabemos como ela aconteceu ou podemos pesquisar e achar alguém que descreveu a encrenca. A mesma coisa sobre a crise de 1929. Mas e essa? Quando muito, um ou outro analista liberal, como o Instituto Liberal, deu alguma explicação. Eu já mencionei uma campanha de uma empresa de outdoor que diz "não fale em crise, trabalhe". Qual foi a crise em que alguém disse "cale a boca"?

Vamos tentar restringir "a crise" ao governo PT. Como Lula conseguiu ser reeleito com a terceira maior votação da história da humanidade no ano seguinte à divulgação do Mensalão no Jornal Nacional? Não só isso: como ele conseguiu eleger uma sucessora? De 2003 pra cá, tivemos algumas grandes empresas falindo. Mas algumas empresas cresceram muito, como a rede Record. Tivemos um bilionário surgindo quase do nada, o Eike Batista. E por que nós temos músicos, atores e diretores consolidados dependendo de dinheiro do Ministério da Cultura? Por que nós temos grandes construtoras dependendo de pagar propinas? Por que as editoras têm queda de receita considerável só porque o governo nas três esferas solicita menos dos serviços deles?

Lula disse na mesma entrevista ao Brasil 247 que "o salário mínimo aumentou quase 74% e a inflação esteve controlada" e "as empresas e os bancos também nunca ganharam tanto", "nem as emissoras de televisão, que estavam quase todas quebradas; os jornais, quase todos quebrados quando assumi o governo". ("Lula diz que mídia nunca lucrou como na era Lula", Brasil 247, 05 de maio de 2013). Como? E o que o povão ganhou do mesmo governo? Empréstimo para aposentado, celular de menos de R$ 300,00, bolsa em universidade privada, cota na universidade pública.

Se vocês pegarem uma literatura de um partido de esquerda tipo PSTU ou PCO, ou mesmo do PCdoB antes de ser governo junto com o PT, vocês vão ver alguma proposta de colocar as empresas sob controle do povo. E este controle do povo é, na verdade, o controle deles mesmos. Isso explica tudo! O PT estatizou a economia junto com a vida social. Mas não era uma ideia de Lula ou Dilma Rousseff, é uma ideia socialista. E Karl Marx ou Paulo Freire nunca disseram que primeiro um partido socialista tem que chegar ao poder político formal e confiscar as propriedades privadas oficialmente para que o Socialismo avançasse. Mas mesmo a direita não entendeu isso, e digo "direita" no mundo. No caso do Brasil, a direita ainda defende o Liberalismo ou o Ultraliberalismo, chamado erradamente de Anarcocapitalismo, só para criticar o PT.

Ah, e tivemos também o Petrolão, que foi um esquema de empresas privadas com o PT. Tivemos empreiteiras como a Odebrecht financiando o PT em troca de favorecimento em licitações da Petrobrás, mas tivemos também o PT, já no governo, adoçando a boca de jornais, revistas e canais de televisão com verba de publicidade estatal. Mas o pior não é que a "grande mídia" se vende, é que ela precisa disso para sobreviver. Não é coincidência o colapso da economia acontecer depois do colapso do PT. É porque o PT atrelou o país. E nós ainda tivemos foi muita sorte.

Esta crise é especial porque é um pacto da imoralidade com a estupidez envolvido num pacto de silêncio, do país praticamente inteiro. Quem votou no PT pensando no FIES, ou no concurso público, ou no salário já no serviço público; quem nunca se incomodou com preferências para mulheres e negros nas empresas privadas, no lugar do mérito próprio; quem nunca se incomodou com cotas nas universidades públicas tirando candidatos legitimamente classificados; quem nunca se incomodou com colunistas medíocres na imprensa subornada via Petrolão; quem conquistou uma coluna de jornal ou um cargo de chefia muito acima do que merece; todos esses são parte do problema.

E a crise também é de inteligência. Nunca tivemos protestos de rua porque o Brasil tinha uma legião de analfabetos funcionais dentro das universidades e um dos piores desempenhos do mundo na educação básica, por exemplo. Mas a crise de inteligência também veio de uma apologia à mediocridade.

Dilma Rousseff está indo pro ralo hoje, mas não é por causa de corrupção, nem mesmo por causa das "pedaladas fiscais". É porque as próprias pedaladas foram uma lambança para esconder outras. Dilma é só um símbolo visível de muita bobagem que o país inteiro tentou não ver até que viu.

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