A Mulher que Acha que Reduzir a População Masculina em 90% Vai Resolver Tudo
ago 21 2014
Femitheist é uma estudante de Criminologia de 22 anos, mãe de um bebê de 3 anos. Num dia enraivecido de 2012, ela bolou o Dia Internacional da Castração na internet. Depois de postar o vídeo no YouTube, saiu para tomar um café. Quando voltou, horas depois, descobriu que tinha criado uma onda de ódio masculino.
O argumento era simples: reduzir a população masculina para algo entre 1 e 10% do número atual, promovendo uma “verdadeira igualdade”.
Ela diz que o Dia Internacional da Castração foi besteira, mas agora é tarde. Femitheist ficou conhecida na internet e hoje, dois anos depois, lidera um culto emergente, alçada à condição de vilã esmagadora de colhões ou a uma realista racional – dependendo para quem você perguntar. A estudante ainda apoia a redução da população masculina, atraindo tanto ultraje quanto devoção em seu site e em seu canal no YouTube. Ela também já escreveu 200 páginas do que espera vir a ser um manifesto de 700 em que explica a filosofia no Femiteísmo. O texto leva o título provisório de “A Proporção”.
VICE: Assumo que “A Proporção” se refira à sua crença de que a população masculina deva ser reduzida em 90%.
Femitheist: Acredito que a igualdade convencional, com uma proporção de 50% entre homens e mulheres, é um sistema inferior. Essencialmente, minhas ideias fariam com que os homens fossem transformados numa classe especial – uma classe muito mais valorizada –, podendo escolher entre uma variedade de mulheres devido à diferença de proporção entre os sexos. Essa é minha intenção. Os homens seriam mais valorizados e a qualidade de vida deles melhoraria sensivelmente. Eles teriam uma existência subsidiada, como férias com tudo pago do nascimento até a morte.
Vamos dizer que as pessoas estivessem disposta a fazer isso, como você reduziria a população masculina tanto assim? Você está falando de abate ou reprodução seletiva ao longo dos próximos anos?
Claro, os homens constituem uma porção substancial das vítimas de crimes violentos e participam pesadamente das guerras, então sempre teremos mortes aí – mas certamente não estou falando de abate. Não defendo um massacre seletivo ou processos brutais.
E como você alcançaria isso então?
Mais pesquisas em design genético seriam necessárias: manipulação de gênero ou sexo, discernimento de sexo pré-natal, abortos seletivos, desenvolvimento da progênie feminina dupla (bebês descendentes de duas mães) e vários outros mecanismos seriam utilizados para alcançar essas aspirações. Esses métodos não serão forçados ou obrigatórios para atingir o objetivo no curto prazo, seriam apenas encorajados nos primeiros estágios. A menos que a pessoa se oponha ao aborto, há poucas razões éticas para achar essa proposição tão ultrajante. A matemática já está sendo feita em todas as questões relacionadas à genética e à sustentabilidade de populações: gargalo populacional, endogamia, mutações, etc. Tudo funciona em favor da minha ideia. Tenho sido meticulosa e cuidadosa. Meu trabalho é revisado por especialistas – ou no mínimo por pessoas com conhecimento extenso – em biologia e genética, e recebi confirmações de que tudo isso funciona.
Isso em teoria – mas e na prática?
Isso vai requerer a reeducação de todos, mulheres e homens, em escolas, nas casas, através da literatura, da mídia, da arte e das redes sociais. É um processo que levaria décadas, gerações e até mesmo séculos. No entanto, essas coisas devem ser feitas para criar um mundo novo e muito superior. Minha missão é conceber e descrever as bases para a realização e o sucesso de tais objetivos.
Que tipo de homem você escolheria para reprodução? Você baseia a seleção em características físicas ou mentais?
Os homens mais indicados seriam os aptos de corpo e mente. Isso também se relaciona com modificação genética. A engenharia genética já se dá por meio de testes feitos pelos casais quando se casam, para a prevenção de passagem de material genético perigoso. Não há dúvidas de que esses conceitos vão se expandir na medida em que formos entendendo mais sobre como o genoma realmente funciona. Homens saudáveis e aptos sempre são ideais, mas não “brutos”, já que isso tem mais a ver com atributos mentais que físicos. Qualquer um levanta pesos. Qualquer critério decidido como grau de excelência terá de ser extensivamente definido e revisado com o tempo ou com os avanços da ciência e da espécie humana e sua necessidade de evolução.
Os homens serão mantidos em isolamento como os garanhões?
Acredito que devemos remover os homens da comunidade e colocá-los em sua própria seção específica da sociedade, como reservas subsidiadas pelo Estado. Não só manteríamos os homens mais seguros, mas as mulheres também. Subsidiando tal reserva através do Estado, poderíamos fornecer aos homens atividades, saúde, entretenimento, abrigo, proteção e tudo o que uma pessoa precisa para viver. Isso vai remover a desigualdade da sociedade. Reduzindo os homens a 10% do total da população, seu valor sociobiológico vai aumentar. Eles vão viver uma vida feliz e segura, e a “descartabilidade” masculina será coisa do passado.
Mas os homens não têm valor além da reprodução?
Se a tecnologia não tiver avançado até o ponto em que o trabalho possa ser feito sem eles, os poucos homens necessários terão permissão para trabalhar fora das reservas para completar qualquer tarefa requerida – caso queiram.
Como escravos?
Não escravos, simplesmente trabalhadores realizando tarefas, da mesma maneira que trabalhadores fazem hoje. Só que sem necessidade de reembolso monetário, porque eles não precisarão disso. Isso seria algo altamente monitorado e regulamentado.
Mas e as ambições do indivíduo? Alguns homens podem querer mais do que viver em currais de reprodução de luxo.
Alguns argumentam que isso seria uma distopia, porque eles não seriam livres no sentido convencional presente. Isso é um equívoco. Seria uma utopia, porque seria um mundo quase sem conflito, onde as pessoas cooperam e são tratadas da maneira apropriada dentro de um sistema bem desenvolvido e forjado a longo prazo. Se tudo é ótimo para quase todo mundo, esse ponto é nulo. Sobrevivência e bem-estar socio-orgânico são os elementos mais importantes da vida. Diversidade de princípios e padrões só é necessária num mundo de múltiplas nações, culturas, sociedades e religiões devido ao medo de opressão. Como este mundo é melhor? Por que algumas pessoas têm oportunidades em potencial de fazer certas coisas?
Isso é meio deprimente.
O propósito de viver é meramente persistir e perpetuar nossa espécie. Se alguém está disposto a te dar tudo o que você precisa para sobreviver e viver confortavelmente, simplesmente porque você existe, então você já alcançou tudo que realmente importa.
Isso rejeita as noções de companheirismo e unidade familiar?
Companheirismo heterossexual e o modelo de família nuclear, sim.
O que você propõe como alternativa?
As crianças deviam ser criadas de maneira comunal e pelo Estado. O modelo nuclear de família é um terreno fértil de decepções, mediocridade, traição, hipocrisia e violência. Isso precisa ser abolido. Intolerância, preconceito e convicções antiquadas são passadas de geração para geração. A unidade familiar convencional doutrina nossos jovens e drena seu potencial. Minha solução seria atribuir o trabalho de criação das crianças a cuidadores cuja tarefa seria fornecer abrigo, comida, roupas e proteção para cada criança – tudo isso cedido pelo estado. Meninas perfeitas seriam concebidas, desenvolvidas e projetadas em centros de reprodução estatais. Elas ficariam num local comunal, sob instrução e controle de professores.
Mas, de modo realista, isso não é o melhor para as crianças.
As crianças devem receber uma educação apropriada, uma educação separada por sexo que vai focar no desenvolvimento de habilidades úteis no mundo real e capacidades de conceito de construção. Elas devem aprender sobre a realidade da igualdade verdadeira, da produção e do trabalho, e terão um entendimento melhor de sexualidade, ciência, cultura e etnia. Se as crianças ficam sob tutela do Estado com cuidadoras designadas, não só será mais fácil desfazer as restrições da intolerância e outras crenças arcaicas que são passadas de pais para filhos, mas as crianças poderão ser usadas para monitorar as gerações mais velhas no que diz respeito à propagação de valores intolerantes e antediluvianos. Isso é uma questão de criar uma percepção unificada.
Isso quer dizer que as mulheres formariam automaticamente relações lésbicas?
Relacionamentos entre mulheres e homens têm sido diferentes por toda a história. Associações entre mulheres e homens diferem com o tempo e a socialização popular. Hoje isso não é comum ou normalizado, mas conforme o tempo for passando, mais mulheres se interessarão por outras mulheres ou estarão dispostas a aceitar e experimentar isso.
Então você acha que orientação sexual pode ser projetada?
Sim. Acredito que orientação sexual, como muitas coisas mas não tudo, vem da socialização além da genética – com uma influência pesada da genética. Quem acredita que orientação sexual é puramente genética é hipócrita e tolo. Poderemos projetar pessoas com uma grande preferência por seu próprio sexo. Me parece que muitas mulheres são mais abertas à homossexualidade do que os homens, ou pelo menos mais dispostas a experimentar – e por que é assim?
Não sei. Você acha que é genético?
Talvez seja parcialmente genético, mas também se deve ao medo arraigado que os homens têm de parecer homossexual, pois não é assim que um “homem” deve ser. Com as forças combinadas de engenharia social e genética, podemos facilmente moldar a sexualidade humana como quisermos.
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Tradução: Marina Schnoor
(VICE Brasil, 21 de agosto de 2014, http://www.vice.com/pt_br/read/a-mulher-que-acha-que-reduzir-a-populacao-masculina-em-90-por-cento-vai-resolver-tudo. Texto original: "The Woman Who Thinks Reducing the Male Population by 90 Percent Will Solve Everything", 13 de agosto de 2014, http://www.vice.com/read/is-reducing-the-male-population-by-90-percent-the-solution-to-all-our-problems)
Comentários de A Vez das Mulheres de Verdade / A Vez dos Homens que Prestam - parte 1: a mocinha diz que as ideias dela foram distorcidas, mas não foram
O vídeo foi publicado em 07/10/2012. A cidadã se identifica como "Krista [Femitheist Divine]". Ela fez uma postagem no blogue dela dizendo que a entrevista "usou 1/3 das minhas respostas totais, e apenas cerca de 1/3 de cada resposta real" ("On the VICE Interview (Corrections)", http://www.femitheist.net/2014/08/on-vice-interview-corrections.html). Por exemplo, o "vai resolver tudo" do título foi uma distorção das palavras dela. Mas nada de essencial foi distorcido. Bom, o ICD (Dia Internacional da Castração), que foi "uma peça não-séria" e "foi meramente uma expressão de uma raiva breve". Mas falando de "raiva breve", Robbie Blakeley do Bleacher Report (Inglaterra) comentou sobre o caso do goleiro Aranha: "Brazilian Football: Is Racism a Major Issue to Be Addressed Immediately?", http://bleacherreport.com/articles/2184087-brazilian-football-is-racism-a-major-issue-to-be-addressed-immediately.
Mas como a turma antifeminista sabe, nem o 10% é um número original: foi proposta da lesbofeminista Sally Miller Gearhart em 1982 (veja esta e outras em http://fathersforlife.org/feminism/miller_gearhart.html). Mas a Femitheist diz que isso vai fazer os meninos serem mais valorizados.
Ah, e ela também diz que "as crianças deviam ser criadas de maneira comunal e pelo Estado" e que "com as forças combinadas de engenharia social e genética, podemos facilmente moldar a sexualidade humana como quisermos". Isso lembra o quê, pessoal?
E ela nega ter dito que "testosterona é a causa primária de seu comportamento violento", mas enquanto o sistema dela "seria um mundo quase sem conflito, onde as pessoas cooperam e são tratadas da maneira apropriada dentro de um sistema bem desenvolvido e forjado a longo prazo", vamos ver o que ela diz sobre os problemas dos homens. Trecho 1:
It's not that they fight against inequality in family/divorce courts, or that they discuss male suicide rates or sexual violence against men or workplace-related deaths or alimony and child support; it's all of the (relatively superfluous) fear and hate-mongering that accompanies those points via their oft-inflammatory and hyperbolic rhetoric.
("RE: Men's Rights Activist Paul Elam vs. Majority Report's Matt Binder", 14 de julho de 2014, http://www.femitheist.net/2014/07/mra-paul-elam-vs-matt-binder-debate.html)
"Não é que eles lutam contra a desigualdade nos tribunais de família / divórcio, ou que eles discutem as taxas de suicídio masculino ou violência sexual contra homens ou mortes relacionadas com o trabalho ou pensão alimentícia e apoio à criança; é tudo do (relativamente supérfluo) medo e do mercado de ódio que acompanha esses pontos através de sua retórica frequentemente inflamada e hiperbólica."
Trecho 2:
It is agreed, generally, that the occurrence of false reports of rape is a rarity, and a majority of the more reliable rates appear to converge at similar lower percentages, but nevertheless, false allegations and reports of rape are still an important issue; false reports of rape are harmful not only to the wrongly accused, but also to real victims of violent crime (who already have difficulties with being believed by extension as a consequence of those who truly do lie).
However, individuals such as MRAs would like to present this issue as being an epidemic, which it is not (it does not even qualify as “endemic”).
("On False Rape Allegations/Accusations (The Rates, Studies and More)", 18 de março de 2014, http://www.femitheist.net/2014/03/on-false-rape-allegationsaccusations.html)
"É consenso, geralmente, que a ocorrência de falsos relatos de estupro é uma raridade, e que a maioria das taxas mais confiáveis parecem convergir em percentuais inferiores semelhantes, mas, no entanto, as falsas denúncias e relatos de estupro ainda são uma questão importante; falsos relatos de estupro são prejudiciais não só para o acusado injustamente, mas também verdadeiras vítimas de crimes violentos (que já têm dificuldades com que se acredite nelas, por extensão, como conseqüência daquelas que verdadeiramente mentiram).
"No entanto, os indivíduos tais como MRAs gostariam de apresentar esta questão como sendo uma epidemia, o que não é (nem sequer se qualifica como 'endêmica')".
E ela só não prega ódio aos homens mais claramente porque existem os "mascus", como diz a Lola Baleia Assassina. Senão, ela seria outra Sally Miller Gearhart. Ou uma outra Valerie Solanas.
Comentários de A Vez das Mulheres de Verdade / A Vez dos Homens que Prestam - parte 2: o pior não é nem quem fala, é quem dá o espaço
Gente, o ponto que eu queria enfocar aqui é que a gente acaba lendo isso porque a imprensa privilegia o Lesbonazismo. Quantas matérias sobre masculinismo você viu na imprensa escrita na vida? Ou mesmo em portais de notícias na internet? Mas o pior nem é quantidade. Assim como Marcha das Vadias é carnaval fora de época, reduzir os homens a 10% da população daqui a, digamos, duas gerações virou curiosidade estilo Planeta Bizarro, ou torcer pro time de futebol X. Para termos ideia, vamos ver os títulos de matérias que mencionaram indiretamente os homens antifeministas:
- "Os homens que odeiam as feministas". Introdução: "De onde vem tanta irritação com as mulheres independentes?". Ivan Martins, revista Época, 12/09/2012, http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/ivan-martins/noticia/2012/09/os-homens-que-odeiam-feministas.html
- "Em defesa do macho oprimido", revista Época, 01/08/2014, http://avezdasmulheres.blog.com/2014/08/09/revista-epoca-publica-materia-criminosa-sobre-o-masculinismo
- "Even Madder Men", Hanna Rosin (autora de "The End of Men: And the Rise of Women"), 22/11/2013, http://www.nytimes.com/2013/11/24/books/review/angry-white-men-by-michael-kimmel.html
E, claro, se houvesse uma reportagem com o título "O Homem que Acha que Reduzir a População Feminina em 90% Vai Resolver Tudo", o sujeito seria execrado mundialmente. Inclusive pelo Movimento de Direitos dos Homens e Meninos. Mas esse homem não existe nem entre os fakes criminosos criados por feministas.
Que gente como a Femitheist Divine fale ou escreva as suas ideias e tenha o que disse publicado em grandes veículos de comunicação, da melhor forma possível dentro de limitações de tempo ou espaço. Mas que gente como ela seja destruída moralmente publicamente por essas mesmas ideias. O problema é que "debate" pra essa turma da imprensa é guerra assimétrica: um lado deve aparecer como é, ou maquiado, o outro como uma caricatura feita pelos inimigos.
Mas uma coisa dessas passar sem escândalo não é só um projeto de engenharia política e social de gente com muito poder e dinheiro. É acima de tudo uma obra de milhões de homens emasculados e imbecilizados. São jornalistas, analistas, professores universitários, policiais, motoristas de ônibus, construindo a sua própria decadência, miséria e insignificância. E fazem isso não tocando em direitos dos homens ou criticando o feminismo nem em comentários de matérias jornalísticas relacionadas ao assunto, ou agindo como "cavaleiros brancos" (homens que defendem mulheres incondicionalmente apenas por elas serem mulheres) ou nem tomando conhecimento de matérias como essa porque estão mais preocupados com a violência contra a mulher ou a homofobia. E o mesmo homem omisso em uma hora "pergunta" por que os antifeministas odeiam mulher.
Como eu digo de vez em quando, o Feminismo é a ideia radical de que mulheres são gente e homens são fêmeas incompletas.
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